[continuando] Começou contando que tem ficado muito irritado no trabalho porque planeja todas as atividades minuciosamente e ensina os colegas, já fez treinamento para eles, mas fica muito incomodado quando eles não seguem aquele modelo que ele ensinou. Diz que se sente deslocado do mundo. Nunca teve relacionamentos amorosos e não tem amigos, nem tem interesse. Gosta de morar sozinho, e fica muito incomodado quando seus vizinhos perguntam como ele está, se quer conversar, e ele conta que sua casa é o melhor lugar. Sonha em morar numa ilha deserta, só com o barulho do mar. E tanto o barulho como a luz no trabalho também incomodam. Sempre foi um excelente aluno com notas 9 e 10, o que está se repetindo agora na faculdade. Quando pergunto a respeito de seus interesses, falou que há pouco tempo atrás quis aprender mais sobre patinação e passou muitos meses vendo vídeos, lendo tudo que podia até que comprou seu patins, e isso sempre aconteceu ao longo da sua vida com outros interesses.
Não entendia o que acontecia com ele e se perguntava se era uma pessoa má, não queria sentir tanta irritação com os colegas, e sabia que tinha 30 anos, era um adulto, mas não conseguia agir diferente.
Conversamos longamente a respeito do seu desenvolvimento. Após uma avaliação completa chegamos ao diagnóstico: Transtorno do Espectro Autista leve, e com toda a demanda social no trabalho abriu um quadro de Depressão.
Hoje, adulto tem a chance de compreender o que acontece com ele de uma maneira mais clara e orientado ao tratamento adequado.
Temos aquele estigma de que nada é doença, que tudo se resolve se a pessoa desejar e se esforçar muito, como um conto de fadas, aonde se você se você pedir muito, a fada madrinha vem e atende seus desejos, mas não. Há sim, situações, emoções, que não irão se resolver apenas se queremos muito, mas sim, se buscarmos ajuda profissional, este foi um caso. Estar alerta, olhar para si, para o outro com seriedade e entender o momento de ir atrás de alguém que possa ajudar, é essencial.